domingo

Trinta e cinco

Fechou os olhos por um instante, atenta a ouvir o que lhe ia por dentro. Para sua surpresa, sem tantos suportes - os filhos, a casa, a vida em comum - a decisão corria caudalosa por suas veias. Doce, fresca e úmida em meio à correnteza, nem era frágil a decisão, mas inteira. Quando abriu os olhos, pela primeira vez em tanto tempo, sorria de um sorriso sem sombras. Sentiu a vida amaciar em seda. Tão subitamente quanto o susto que a havia lançado ao deserto, podia enfim molhar os lábios. Os olhos. As mãos.

sábado

Trinta e quatro

O abismo com o qual flertava era tão mais fundo que a enorme distância que persistia dentro dela? A distância entre a vida que ela vislumbrara possível ao encontrar o outro e as sucessivas mortes cotidianas? A distância que ia da luminosidade do encontro às milhares pequenas noites dos desencontros - vagalumes às avessas, manchando o dia ensolarado que o outro lhe cavara por dentro?

sexta-feira

Trinta e três

Paralisada. Como se ainda estivesse encostada ao batente da porta, os olhos secos e lúcidos. O que estaria deixando para trás? O que encontraria à frente? Certamente não seria o outro, distante como sempre. Vivo, por certo, mas tão inacessível como antes. Ela sabia que o passo à frente era na direçao do abismo: vazio. Pedra nua. Solidão.